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Carioca Prog Festival 2023 - dia 28/10 (2023-11-04)

Marcello Rothery


No dia 28 de outubro de 2023, ocorreu o último dia do Carioca Prog Festival 2023. Festival organizado há anos por BeProg (Brasil) e LibertArte (Portugal). Uma das (felizmente) muitas iniciativas feitas na base da determinação na vida musical do nosso país.

Poucos recursos financeiros tornam mais difícil a divulgação e a própria formação do lineup dos shows. No Brasil isso já é realidade há décadas, e de certa forma ficou mais difícil no pós-quarentena, pois uma parte do povo acabou se acostumando a ficar mais tempo em casa.

Mas como eu sempre fui apaixonado por shows, e igualmente apaixonado por rock progressivo, isso não seria obstáculo. E vou falar uma coisa: esses eventos são verdadeiras celebrações, é como uma reunião de amigos, um clube de apaixonados e teimosos que insistem em fazer, prestigiar e viver em torno de música de qualidade.

E isso tinha de sobra no Teatro Municipal de Niterói. As duas bandas, Arcpélago e Caravela Escarlate, possuem um repertório calcado em progressivo sinfônico, com arranjos bem complexos e músicos de qualidade inquestionável.

Em ambas as bandas, Ronaldo Rodrigues comandou os teclados. Um desfile de timbres clássicos (que revelam o extremo bom gosto de Ronaldo no assunto) e perícia na execução (que revelam sua qualidade como músico). Ronaldo também é o vocalista na Arpélago, que já possui um cd no mercado: Simbiose, de 2016. A banda sofreu uma mudança na formação: a troca de guitarrista. Marcelo, o novo membro das 6 cordas, se mostrou bastante integrado aos companheiros, com sua guitarra aparecendo com muita força no som inteiro. Apenas o volume dela me pareceu um pouco baixo em alguns momentos. Adepto da fender strato, Marcelo intercalava passagens mais de acompanhamento com momentos em que ele tomava a frente, com alguns solos bem melódicos, e outros mais rápidos.

O baixista, Jorge, me chamou muito a atenção. O som cheio do seu instrumento foi parte fundamental no som da banda, preenchendo espaços de uma tal forma que me chegou a lembrar um grande ídolo pessoal: Louis Cennamo, baixista original do Renaissance. Fera! Arrebenntou! E o batera Renato conseguiu dar um show mesmo usando um kit relativamente pequeno.

O destaque do show foi, para mim, a faixa de abertura: Sopro Vital, que também é a faixa de abertura do cd, e é a minha música favorita da banda. Mas gostei do material todo, inclusive das músicas novas, que entrarão no novo cd que a banda está prestes a começar a gravar.

Após um breve intervalo, a Caravela Escarlate assumiu o palco. Lá estava Ronaldo novamente nos teclados, junto com David Paiva (cantor, compositor principal e baixista da banda) e Élcio Cáfaro na bateria. Esse show eu estava bastante ansioso em assistir, pois adorei o novo disco da banda (disco mesmo, pois foi lançado também em vinil, e eu fiz questão de pegar um exemplar neste formato). Diferente do show que eles fizeram no mesmo teatro há alguns anos, antes da pandemia, não rolou muita coisa dos primeiros álbuns, e o único instrumento que David tocou foi o baixo. No qual, aliás, deu mais um show! O dia foi de dois baixistas "monstros", ambos tocando de um jeito que particularmente me agrada demais: preenchendo todos os espaços, sem aparecer de forma gratuita; apenas enriquecendo o som da banda. E David conseguia fazer isso mesmo enquanto cantava. Show de bola!

Ronaldo deu mais um show nas teclas! Aqui eu gostaria de destacar em especial uma lindíssima passagem de mellotron que abriu a música Cruz da Ordem, do disco novo. É um deleite para os ouvidos o que ele faz nessa introdução, e ficou igualzinho ao vivo!  
Outro destaque é a faixa de abertura desse disco, e que foi a segunda música do show: Bússula do Tempo, com seu empolgante riff de teclado e a voz forte de David! Essa não pode ficar fora de show nenhum da banda! 
E para fechar os destaques, as lindas faixas que fecham cada lado do LP: Mandala e Filtro dos Sonhos. No show, o David contou que ambas seriam uma só suíte bem grande, mas que acabaram decidindo deixar as duas partes separadas em cada lado. São talvez as melhores músicas do disco, muito belas mesmo!
Impressionou o fato da banda, mesmo usando menos instrumentos, ter feito um som tão cheio e complexo neste último disco e no show. Perguntei ao David depois do show porque ele não tocou guitarra no disco, e ele respondeu que foi mais por praticidade, lembrando que boa parte do processo de criação do repertório foi durante a fase mais pesada da pandemia, com todo mundo em casa sem comunicação com o mundo externo.
Senti falta de material do primeiro disco, que eu gosto muito. No show anterior, eles tinham tocado. Foi inclusive um momento no qual o Ronaldo assumiu um violão, e o David ficou na guitarra. Mas isso não tirou nada do brilho deste show. Assim como no disco, a banda soube fazer um baita concerto com apenas teclados, baixo e bateria. 
Saí de alma lavada. E ainda tive tempo para conversar com o pessoal do lado de fora, inclusive com o pessoal das bandas, que era um verdadeiro grupo de amigos, ambiente ótimo! Isso faz uma baita diferença também! São todos apaixonados pelo que fazem. Está lá para quem quiser conferir os shows: músicos de qualidade inquestionável, fazendo um baita trabalho num estilo musical que não toca no rádio, mas não deixa até hoje de conquistar o coração de muita gente! O rock progressivo não vai morrer nunca!


Fonte :


Progbrasil