Fantástico, vai rolar direto no meu som
Lançado em 2004, este cd duplo inaugurou, junto com o Colossus of Rhodes, duas tendências da revista finlandesa : a de criar projetos dedicados a filmes clássicos (sobretudo italianos), e a de álbuns onde cada artista cria épicos em torno de 20 minutos de duração. Esta última, uma tática bastante ousada, e também arriscada, mas que mostra claramente o foco da revista : os admiradores mais fanáticos de música progressiva.
O primeiro Spaghetti Epic é, como era de se esperar para uma coleção com 6 épicos de 20 minutos, difícil de se assimilar, e de se ouvir inteiro de uma vez. Para assimilar bem o seu rico conteúdo, eu recomendo ouvir aos poucos. Porque se trata de uma obra de grande valor, onde 2 das suítes são maravilhosas (a primeira e a última), e nas outras há momentos brilhantes, além do álbum ser rico em termos de estrutura, bem produzido, e esbanjar qualidade na execução dos vários instrumentos que as bandas utilizam. E retratar muito bem, em toda sua extensão, a atmosfera western do filme.
Centrado no filme Once Upon a Time in the West, é impossível falar deste projeto sem falar da sua fantástica faixa de abertura : The West, uma das últimas criações dos finlandeses do Haikara antes do falecimento do seu talentoso líder e mentor Vesa Lattunen. Seguindo o caminho da faixa que abre o projeto Kalevala, a banda criou uma suíte sinfônica que consegue ser ao mesmo tempo tensa e relaxante, com evolução lenta e base comandada pela dupla baixo/violoncelo, que dá um belo toque erudito à suíte, e deixa o caminho livre para Vesa se alternar entre os teclados e guitarras.
O começo é levado em delicada voz feminina e violão (com um acordeon ao fundo dando um toque "western"). A longa segunda parte entra, com o já falado clima meio tenso e cativante, com baixo, violoncelo e piano fazendo a base, sob uma linda melodia que tem um discreto vocalise da cantora junto com os instrumentos. O tema evolui para uma variação apenas no piano (e com um pouco mais de vocalise), e então muda para um andamento mais acelerado, e uma melodia mais roqueira, com a guitarra aparecendo um pouco mais em uma base bem bacana.
Assim a suíte segue, com o tema ficando novamente mais lento, teclados reaparecendo mais, até os dois minutos finais, quando a canção se encerra com um retorno ao tema inicial, apenas de voz e violão. Uma suíte impressionante, de construção genial e desenvolvimento realmente incrível, coisa de gênio. Uma das melhores coisas que eu já ouvi em todos os projetos da Colossus.
A segunda suíte, Jill, é assinada pelos italianos do Randone. Trata-se de uma suíte sinfônica italiana até a medula, que intercala trechos instrumentais (onde esbanja não apenas técnica, mas também belas melodias) com partes onde um vocal masculino e dois femininos se revezam, e vão causar estranhamento a muita gente, por serem bastante calcados no romantismo italiano. Teclados e guitarras solam à vontade por toda a suíte, intercalando com os trechos vocais, e com eventuais passagens de violoncelo e flauta. Enfim : esta suíte, que beira os 22 minutos, é repleta de belas passagens, e a banda mostra qualidades tanto nas melodias quanto nos arranjos e no talento como instrumentistas. A grande quantidade de mudanças de melodia e andamento a torna de difícil assimilação, há momentos que você se perde na audição, e fica meio sem saber onde a canção está. Mas o resultado final, na minha opinião, é muito bom, só precisa de mais audições para se assimilar.
O primeiro cd se encerra com outra banda italiana, o Tilion, e a suíte Cheyenne. Também tem uma forte "cara" de prog italiano, embora seja menos complexa, e menos inspirada, que sua antecessora. No lugar do apelo melódico (e por vezes romântico), temos uma atmosfera mais sombria e reflexiva. O vocal masculino é mais sério, e talvez um pouco mais bem encaixado na suíte. Instrumentalmente falando, os teclados aparecem mais, embora há também boas passagens de guitarra. No geral, uma suíte razoável.
O segundo cd abre com a bela suíte Harmonica, assinada pelo projeto La Voce Del Vento, que apesar do nome é inglês (trata-se de uma banda montada por Andy Tillison e Guy Manning exclusivamente para os projetos da Colossus). A parte inicial é de uma agradável melodia de voz e violão. Evolui para uma parte instrumental com forte presença de hammond, e uma levada que lembra um pouco Focus, oscilando entre jazz e sinfônico. Basicamente, a suíte intercala trechos que oscilam entre estas duas atmosferas, além de ter um refrão que é repetido várias vezes (algo pouco comum em uma suíte deste tamanho), e algumas passagens de guitarra que fazem um bom contraponto com o órgão.
Talvez a mais ousada das suítes deste projeto seja a que vem agora. Morton, assinada pelo trio italiano Taproban, é dividida em 6 partes bastante distintas entre si. Começa como um country rock um pouco pesado, levado no baixo, que é tocado como se fosse uma velha guitarra, com um efeito de peso que lembra o som de bandas como os americanos do Kyuss. Acompanhando o baixo, um moog e a bateria (a suíte não tem guitarra), o resultado bastante interessante. No trecho seguinte, o órgão toma a frente do som, e cria um clima de suspense, para a seqüência instrumental acelerada que vem a seguir, que ao meu ver é o ponto negativo da suíte; carece de inspiração e é cansativa, quase uma masturbação sonora de baixo e bateria, com um solo de teclado pouco inspirado.
Após este trecho, porém, a coisa melhora, com a entrada de um trecho instrumental e calmo de piano, que evolui para uma linda melodia, conduzida também no piano, com baixo e bateria acompanhando, e uma cantora convidada fazendo um vocalise realmente muito bonito, que dá um ar meio sobrenatural à música (proposital, pois estes trechos falam da morte do personagem Morton). Este é o trecho da música que gruda na cabeça, uma das passagens mais bonitas de todo o álbum.
Este primeiro Spaghetti Epic se encerra com uma linda suíte instrumental sinfônica : Frank, assinada pelos holandeses do Trion. Rica em belas passagens de órgão, mellotron e solos melódicos de guitarra, esta suíte é um verdadeiro deleite para os ouvidos de qualquer fã de progressivo sinfônico; não tem nem muito mais a se falar, é uma belíssima faixa, muito bem estruturada, e que não tem qualquer trecho menos inspirado. É ouvi-la do começo ao fim, e se deliciar com a bela peça que estes holandeses construíram. Esta e a faixa de abertura, sozinhas, já fazem valer o preço do cd.
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