Obra-prima, irretocável
O projeto “Keys To Ascension” encampado pelo Yes nos anos noventa foi constituído por uma série de concertos nos Estados Unidos e também pela
produção de rico material em estúdio, trazendo mais uma vez a reunião de uma formação que havia se juntado, de forma integral, pela última vez ao fim da década de setenta. O encontro desse time antológico que tantos bons serviços havia prestado à música de qualidade, mais uma vez produziu um grande rebuliço no meio, principalmente porque o show realizado em San Luis Obispo na Califórnia contou com um set list escolhido pelos admiradores do grupo, dessa forma, grandes clássicos que já não vinham sendo executados há muito tempo, passaram de imediato a fazer parte da lista, tais como a maravilhosa “Turn Of The Century”.
A formação aqui, responsável por levar milhares de fãs de todo o mundo à
Califórnia é clássica: Jon Anderson – vocais, guitarras e harpa, Steve Howe – guitarras, Chris Squire – baixo, Rick Wakeman – teclados e Alan White – bateria. “Keys To Ascension II” chegou às prateleiras na forma de cd duplo, mais tarde ocorreu o lançamento também em dvd. O primeiro disco mostra uma parte da apresentação realizada em San Luis Obispo, sendo integralmente ao vivo e o segundo apresenta cinco composições de estúdio.
A apresentação ao vivo acredito ser espetacular, não imaginava ver uma banda tão envolvida, tão afiada, com enorme sinergia e entrosamento entre os cinco integrantes. Fizeram um show inesquecível, inclusive produzindo novos arranjos para alguns clássicos, o que dizer do piano de “Time And A Word”? O que já era bom no passado, ficou ainda melhor, de um lirismo que acaba sinceramente arrepiando e aquele agradecimento que Jon Anderson faz ao término da música, produz a reação espontânea do público de ovacioná-lo, pois assim como os que lá estavam, creio que o agradecimento maior ainda surge por parte dos fãs diante de um show tão requintado e memorável.
Acho interessante diversos comentários que leio a respeito desse projeto do Yes, muitos relacionam o retorno dessa formação à um mero golpe de marketing, já que a fase Rabin tinha terminado e ficou uma dúvida no ar se a banda seguiria a sua jornada ou se findaria de vez por conta do fim dessa longa fase Rabin e nada mais apropriado que uma nova reunião para angariar capital e deixar todos felizes. Respeito a opinião daqueles que pensam dessa forma, mas vejo os fatos de forma completamente distinta, é verdade que o Yes pode ter feito ao longo de sua vasta carreira inúmeras jogadas de marketing com alguns trabalhos irregulares e o constante lançamento de inúmeras coletâneas ao longo das décadas e até os dias atuais ainda nos deparamos com algumas delas,
principalmente no tocante a lançamentos em dvds. Mas em “Keys To Ascension”, as coisas foram diferentes do encontro em “Union”, por exemplo. O esmero da banda foi muito grande, não é fácil para um grupo de pessoas consagradas e com trintas anos de carreira passar horas a fio ensaiando músicas complexas e que estavam relegadas ao passado para um show com impressionante riqueza de detalhes, a palavra que se encaixa muito mais adequadamente que marketing é tesão! A verdade é essa, o Yes estava com tesão nesse projeto e como disse anteriormente realizou uma apresentação memorável. Esse tipo de retorno o seu grande par, o Genesis, vem tentando há mais de trinta anos sem êxito. Outro indício de que o marketing não estava em primeiro plano, está no fato da banda
ter produzido um bom material em estúdio, com duas grandes suítes e outras músicas de boa qualidade, não se reservando apenas aos shows. O Yes, no meu entendimento, conseguiu provar que a fonte não havia secado, como muitos imaginavam!
O destaque no primeiro cd reside na interpretação de dois grandes clássicos: “Close To The Edge” e “Turn Of The Century”. Steve Howe conseguiu efeitos impressionantes ao longo dessas duas músicas e ainda destaco o belíssimo solo que fez em “And You And I”. Rick Wakeman por sua vez, não deixou por menos e em “Turn Of The Century” sua participação foi magistral com toques extremamente emotivos e líricos, essa foi outra que superou a versão de estúdio, ficou um primor. Outro aspecto a se destacar é a força vocal de Jon Anderson, apesar do inclemente passar do tempo, a sua voz continua um aço e cantar “Close To The Edge” com tanta empolgação e precisão não é fácil.
No segundo cd, temos em “Mind Drive”, provavelmente, a melhor composição do Yes desde “Awaken”, sem qualquer exagero, perfeita do início ao fim, nos seus quase vinte minutos, com todos os atributos que fizeram o nome do Yes. Possui variedade de melodias, mudanças de tempo, estrutura musical complexa, inúmeros timbres de guitarras e teclados. A introdução no violão de Howe é muito bela, sendo acompanhada de forma suave por Wakeman, até a entrada da bateria de White que imprime uma tensa dramaticidade à música que segue, dessa forma, até a entrada triunfante dos vocais de Jon Anderson. Lamento ainda não ter ouvido
essa música ao vivo!
“Foot Prints” mantém o alto nível da sequência em estúdio, aqui já tenho a certeza de que não estou diante de um Yes amarfanhado pelo tempo, de que “Mind Drive” não ocorreu por uma inspiração efêmera. Aqui quem dá o tom é Squire com uma maravilhosa linha de baixo, ficando mais evidente momentos antes da entrada do refrão, a de se destacar também a presença de Wakeman, que ao contrário de outros trabalhos, teve participação intensa no projeto de estúdio, inclusive fazendo parte de algumas composições, a sua alternância nessa música entre grand piano e sintetizadores é impressionante, com vários solos fantásticos durante o desenvolvimento da mesma, não nos poupando de toda sua genialidade.
“Bring To The Power” é considerada por muitos como a melhor música desse segundo cd, realmente é belíssima também. Possui introdução acústica e vai crescendo aos poucos, tomando forma completa com a entrada dos vocais de Anderson. Segue de uma forma moderada com o dinamismo do baixo de Squire e diversas incursões de violões, sendo que na metade da música Howe troca as violas pela guitarra e passa a ser acompanhada pela força dos sintetizadores de Wakeman em grande momento. Há de se destacar também a variedade de efeitos produzidos pela bateria de White.
A quarta música lembra muito os bons momentos solos de Jon Anderson, denominada “Children Of Light” e possui assinatura do renomado Vangelis em seu primeiro movimento, possuindo uma base de piano muito bela executada por Wakeman. Por fim, temos “Sign Language” fechando o cd de forma muito apropriada com Wakeman mais uma vez nos bridando com leves toques ao piano, seguido por uma guitarra inspiradíssima de Howe. “Keys To Ascension II” é uma autêntica overdose do bom Yes, com clássicos e novas músicas, trabalho altamente recomendado para que de fato admira o grupo e sentia saudades desse time novamente criando algo de qualidade.
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