Discoteca básica, fundamental
O ano de 77 foi de fato proeminente para a música eletrônica alemã com a repercussão de dois lançamentos de peso das duas maiores bandas mundiais no estilo: Tangerine Dream com a sua mais densa viagem onírica ao vivo retratada em ?Encore? e o Kraftwerk com o magistral ?Trans-Europe Express?, tema dessa resenha. A partir dessa etapa diria que a música eletrônica laicizou-se de vez ao redor do mundo, saindo de um universo destinado ao um público restrito e arrebanhando admiradores das mais diversas tribos musicais e elevando o prestígio com a aclamação da crítica. Ainda que ?Ricochet? e ?Autobahn? foram responsáveis pela centelha, a afirmação popular desse estilo veio de fato a partir de 77.
Em ?Trans-Europe Express?, na minha opinião, o Kraftwerk atinge o auge, conseguindo mesclar o estado minimalista de sua sonoridade com passagens melódicas arrebatadoras e solos de teclados incidentais em todas as músicas como se fossem o óleo nas engrenagens dessa máquina fantástica. Nesse trabalho fica claro que o Kraftwerk é a grande banda de riffs de sintetizador, elementos inesquecíveis para qualquer ouvinte, não me furto a dizer que se alguém ouvir uma única vez a música tema, jamais esquecerá o ritmo dos teclados, não pela repetição, pelo ostinato; mas, sobretudo pela força criativa contida nos riffs. É como se Ralf Hütter e Florian Schneider fossem os Rick Blackmore e Tommy Iommi dos teclados, na elaboração de passagens marcantes e inesquecíveis através dos mais diversos riffs de sintetizadores.
É interessante observar a capa desse álbum e tentar imaginar qual é o tipo de som produzido por quatro sujeitos de terno com cara de almofadinha, talvez esse seja um dos aspectos mais surpreendentes do grupo, ou para dizer a verdade, desconcertante mesmo. Olhando a foto dos quatro, é praticamente impossível imaginar a profusão sonora de que são capazes, a força inovadora presente na música da banda, quase revolucionária, com efeitos incríveis, sintetizadores diversos, sons alucinantes e muita criatividade.
?The Hall Of Mirrors? representa uma das composições mais audaciosas da carreira do grupo, já que utiliza os efeitos eletrônicos em prol de uma atmosfera angustiante, depressiva e acima de tudo humana. Aqui notamos o maior contraponto da vasta obra do Kraftwerk que sempre pautou a sua musicalidade na concepção de máquinas, robôs e temas cosmopolitas ligados ao futuro. Em ?The Hall Of Mirrors? a percussão eletrônica descansa e deixa espaço para mais que uma música, na verdade uma reflexão e, sobretudo, humana. É possível fazer um paralelo dessa composição com a obra clássica de Oscar Wilde ? ?O Retrato De Dorian Gray? ? já que o espelho reflete a personalidade distorcida de uma pessoa que se acha perfeita.
Na música tema o Kraftwerk convida o ouvinte para uma viagem fantástica por um roteiro europeu que passa por pontos turísticos do continente, tais como o Champs-Elysées e Viena e retornando à terra natal ? Düsseldorf, a bordo de um expresso mágico em que os sintetizadores da percussão eletrônica imitam com perfeição o som de uma locomotiva. Um clássico absoluto da banda!
Eu considero o álbum ?Trans-Europe Express? como o carro chefe do Krfatwerk, porém não existe uma singularidade entre os seus admiradores no que tange esse aspecto, ocorre uma grande divisão de preferências principalmente entre a obra citada, ?Autobahn?, The Man-Machine? e ?Computer World?. O fato é que graças a esses trabalhos, os alemães expandiram seus tentáculos, tendo muito amantes do rock progressivo como fiéis admiradores da sua rica profusão sonora, onde denominam o estilo do grupo de progressivo eletrônico.
Dentro desse contexto temos como referências o já citado Tangerine Dream, Klaus Schulze, Vangelis, Andreas Vollenweider, entre outros. Mas, independentemente de rótulos, o Kraftwerk é uma banda que merece uma atenção especial, por criar um estilo peculiar, por serem únicos. |
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